terça-feira, 20 de abril de 2010

RTP Madeira: um fato à medida


Há na recente reorganização de serviços da RTP e RDP Madeira uma cortina de fumo descarada que  ameaça seriamente a idoneidade daqueles que lideraram e montaram toda aquela encenação exótica.
Nada disto é novo e muito menos me surpreende, mas o excesso de desfaçatez ao forjar um fato à medida de interesses distantes dos objectivos da rádio e televisão públicas deve merecer a indignação no tempo adequado.   
Enquanto muitos madeirenses andavam de cabeça às voltas com a tragédia de 20 de Fevereiro,  eis que alguns senhores congeminavam  com afinco para tentar vãmente “tornar coerente uma mudança incoerente”.  Para volver “adequada” uma alteração altamente “dissonante”.
Não se trata apenas da opção, talvez mais mediática, de uma comissão de aconselhamento. Refere-se, sobretudo, à transição efectuada para um modelo de gestão do serviço de rádio e televisão que não cumpre sequer objectivos de contenção de custos (a estrutura de gestão alarga-se) ou de aproveitamento dos recursos internos (envolve quadros externos à instituição) ou ainda de aprofundamento das especificidades e necessidades do serviço público na RAM. Mas, mais grave que tudo isto, esta mudança denuncia intenções e esclarece dúvidas: a alteração orgânica apenas tem lugar na Madeira. Não é uma estratégia da administração para os centros regionais. É um modelo para impingir aos madeirenses: sem reflexão, sem discussão, por detrás dos bastidores, mais uma vez no pressuposto e no desplante de considerar que os madeirenses hão-de aceitar aqui o que ninguém aceita nem no País e nem  na Europa. Pior. Discutido de restaurante em restaurante ou entre os intervalos de jogos de golfe. Uma  audácia sem limites de um cozinhado a cheirar a esturro e de uma tacada viciada!
Estaríamos perante o dilema do ovo e da galinha, duvidando de quem tinha chegado primeiro, se não fosse já descortinado parte do enredo. Se é verdade que o actual director de canais (?) não merece, em termos curriculares, qualquer dúvida - o parecer da ERC é objectivo e rigoroso e, pelo menos por enquanto, ainda é cedo para avaliar a sua capacidade de manter a isenção e independência -, o  mesmo já não é possível afirmar do director com responsabilidade de gestão que, aparentemente, ficou de fora do parecer da ERC, escapando à sua análise e juízo.  Resta a dúvida: se este é o modelo adequado para a Madeira, porque também não é o para os Açores? Pedro Bicudo pode acumular as funções de gestão e de informação. Porque razão Gil Rosa também não pode?  
Quanto ao Conselho de Aconselhamento, os seus objectivos merecem a minha mais elementar concordância, se falarmos no plano estrito dos princípios. Com uma sociedade civil castrada, um governo persecutório e totalitário, faz todo o sentido um órgão desta natureza que ajude à independência das decisões da instituição. E quanto à execução concreta desse princípio? Ora, é aqui que reside o problema. A Comissão apresentada é totalmente obtusa na sua forma e na sua constituição.
A RTP tem um conselho de opinião e a sua administração, a mesma que engendrou a solução da Madeira, sabe que é composto por membros indicados por associações, organizações não governamentais e outras entidades representativas dos diferentes sectores de opinião pública, incluindo o parlamento e as assembleias legislativas regionais.
Os seus membros são inteiramente independentes de quem os indica. Um conselho de aconselhamento criado desta forma teria o meu total apoio e regozijo. 
Mas esta imitação “low cost” do conselho de opinião da RTP não foi criado de forma adequada e a sua composição não traduz os interesses da sociedade civil. Infelizmente, a pluralidade de opinião e a isenção estão longe de estarem garantidas com um órgão desta natureza. Percebemos todos a “estratégia de paróquia”, convidando elementos vulgarmente conotados, agora ou no passado, com o PS M, numa espécie de “serviço mínimo do pluralismo”.  Mas não chega e muito menos  satisfaz o que simula cumprir: o pluralismo real e não encenado. A indicação de um conselho desta natureza ultrapassa as conotações partidárias e deve seguir uma forma consistente para não se tornar escandalosa!
Nada disto é neutro para a Democracia e a pluralidade. Receio que continuaremos numa situação em que não se separa o trigo do joio, ou melhor, separa-se - renegando o trigo e relevando publicamente  o joio.

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