segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

Sair da Caverna


Depois de ter escrito uma curta reflexão sobre as expectativas para a economia da Madeira para o ano 2010, que publiquei no meu blogue pessoal, senti um calafrio que me deixou cabisbaixo.
Curiosamente, não por causa da dura realidade com que seremos efectivamente confrontados, mas porque verifico com tristeza e, sobretudo, com uma espécie de humilhação inultrapassável, as semelhanças daqueles que ousam pensar e contar diferente,  com o  homem da caverna que Platão genialmente descreveu na sua conhecida alegoria d’“o mito da caverna”.
Platão quis mostrar que devemos aprender a pensar por nós mesmos e, principalmente, que é preciso aprender a ver não só o que as pessoas que têm o poder nos mostram, mas ver para além disso e até diferente disso.Há, entre nós, muitos que não querem sair da caverna. Pior. Há entre nós alguns que criticam duramente os que saem da caverna,  fazendo, assim, cair sobre si mesmo, e sobre os restantes, um forma de comodismo insuportável e, sobretudo, castrador de uma sociedade moderna, aberta e criativa.
Não tenhamos nenhuma ilusão: O que o poder regional nos serve diariamente é-lhe útil para transmitir a ideia (já desgastada) de um admirável mundo de sombras projectadas numa caverna escura e repleta de contradições. Ou saímos dela e procuramos a realidade, ou deixamo-nos envolver nesse jogo escuro de obstáculos e mentiras. Sair da caverna é difícil. Implica uma estóica vontade de saber a verdade. Mas, voltar para contar aos que ficaram pode ainda ser pior, como nos descreve Platão. Na verdade, ninguém gosta. Eu pelo menos não gosto, de ser ofendido na minha honra, nos meus princípios e naquilo que é o essencial do meu pensamento, de forma gratuita ou mesmo por “preguiça” de conhecimento. Por isso, ser mensageiro de “novas verdades” ou de uma outra realidade é um fardo pesado na caverna em  que alguns  escolheram  viver e, pior ainda, querem impor aos outros. Quanto mais ouvirmos, quanto mais soubermos, quanto mais discutirmos, menos sombras nos iludirão. Este poderia muito bem  ser a essência de um desejo de inicio de ano novo. Mas um ano não chega. É preciso mais tempo. Mas também mais gente com mais coragem para afastar-se do logro cómodo das sombras que nos iludem sistematicamente, sem qualquer hesitação e com uma feroz vontade de atropelar os interesses comuns.
Assim, depois de tudo isto, sobra um nó na garganta de quem espera  um ano de dificuldades sempre ocultadas, de realidades ficcionais e de responsabilidades nunca assumidas a atribuídas a quem de direito e que, de facto, devia assumi-las.
Para 2010 seria mais cómodo ficar na caverna. Muitos ficarão. Mas a imprudência quase sempre resulta mal, por isso falarei a verdade. Como escreveu Italo Svevo, sobre o seu próprio livro “Senilidade”, “não existe unanimidade mais perfeita que a do silêncio”, por isso não se trata de ser ou não generoso, de ser ou não pessimista, de ser ou não prudente. Trata-se sim da constatação insuperável de que é preciso que o juízo sobre o governo de Jardim não seja uma obra prima da propaganda. Não é um desafio partidário. Enganam-se os que procuram aí a justificação para a critica legitima às decisões fracassadas do governo em exercício na Região. É um projecto para a sociedade madeirense.
Mas esta constatação encerra um sentido irónico e paradoxal na nossa trágica existência quotidiana. Na verdade, depois  de uma severa multiplicidade de erros, cumplicidades perversas e prevaricações óbvias por parte de um governo que, além de amador, é também uma espécie de “holding” de interesses. Aparentemente, nada motiva a sociedade à mudança: nem um mau governo; muito menos a corrupção, onde a haja, e menos ainda o desacerto na utilização dos recursos. Faz-me pensar se todos estamos a cumprir o nosso papel em democracia. Faz-me desejar que todos façamos um esforço para sair da caverna e voltar para contar o que vimos. Só assim pode arrancar o projecto de mudança. E mais cedo do que tarde, confrontar-nos-emos com ele. Ninguém foge ao seu Destino. Nós cumpriremos o nosso.
publicado no DN Madeira



1 comentário:

Anónimo disse...

Acedam ao novo blog contra o regime mamadeira:
http://verdademadeira.blogspot.com/