As expectativas para 2010 devem ser analisadas à luz das opções
tomadas no passado e tendo presente a estratégia de governo vertida no
orçamento regional para 2010.
Por isso, não vale a pena falar do futuro, de forma sustentada, sem
três premissas complementares: 1) o diagnóstico económico-social da RAM; 2) o
percurso mais recente da economia regional; 3) e as opções de política
económica que nortearão a governação regional em 2010 e, portanto, as
respectivas expectativas futuras.
1. Diagnóstico económico e
social
Os indicadores disponíveis obrigam a uma reflexão profunda quer na
economia quer na componente social.
Na economia destaca-se o seguinte:
a.
a crise no turismo, onde todos
os dados disponíveis apontam para a depreciação gradual do destino (queda
sistemática do Rev Par e das taxas de ocupação,por ex.);
b.
a paragem brusca e inevitável
do investimento público, decorrente da ausência de meios financeiros próprios
para o financiar;
c.
a incapacidade do Centro
Internacional de Negócios da Madeira (CINM) de catapultar uma dinâmica de
crescimento económico que possa substituir (ou ser complementar) às
dificuldades do turismo. Tudo por culpa de um poder adormecido face às
potencialidades do CINM;
d.
a crise da construção civil,
sector que imprimia um natural aquecimento à economia mas que dependia
exclusivamente do sector público e do turismo, ambos em crise profunda;
e.
o crescimento da dívida pública
que retira margem de manobra ao governo regional para a apresentação de medidas
anti-cíclicas coerentes e eficazes;
f.
a erosão da propensão ao
consumo e ao investimento por parte do mercado interno em virtude da ausência
de uma política fiscal competitiva;
g.
o efeito sobre a economia de
opções erradas de investimentos cujos encargos de manutenção aumentam a despesa
corrente e não libertam meios para a amortização da divida. Estas opções
resultaram num custo de oportunidade cujas conseqüências negativas ainda são
difíceis de avaliar.
h.
O efeito sobre as PME’s
regionais da ausência de pagamento a tempo e horas aos fornecedores regionais
provocando um garrote asfixiante à actividade do sector privado endógeno;
i.
Um sector privado frágil e cada
vez menos dinâmico. A RAM foi a Região do pais onde, no último ano e de acordo
com a empresa D&B, mais empresas pediram a insolvência e one o risco
comercial é mais elevado conduzindo ao aumento exponencial das
dificuldades dessas empresas se
financiarem junto da banca.
Na área social destaca-se o seguinte:
a. um desemprego que não pára de crescer. Numa população activa de 126
000 indivíduos a RAM já ostenta mais de 13 500 desempregados. Uma taxa que já
supera os 10%. Superior à media Europeia;
b. níveis de pobreza superiores à media nacional. Segundo alguns
estudos, designadamente o último do banco de Portugal, mas também o apuramento
realizado pelo INE sobre o rendimento das famílias, a RAM é, por um lado, a
região do país com mais pobres, face ao global da população, e por outro, é a
região do pais, a par da região norte, com o risco de pobreza mais elevado;
c. é a região do pais com piores índices de conforto;
d. é uma das regiões com rendimento primário menor do que a criação de
riqueza produzida, indiciando disparidades entre a riqueza e a distribuição de
rendimentos.
e. Ostenta problemas graves, e em crescimento, de alcoolismo, e de
toxicodependência. Alem do aumento evidente do crime, mesmo que menos violento
mas denunciando a fragilidade social que nos encontramos.
Perante este cenário sócio-económico importa reflectir sobre o que
nos fez caminhar para esta trágica situação.
2. A evolução recente
Contudo, não me parece relevante, ou mesmo prudente, o discurso
catastrofista ou fatalista. Antes, é necessário muito realismo e pragmatismo de
modo a ser possível aplicar todas as iniciativas capazes de retirar a região
deste beco estreito que a governação do PSD nos atirou.
Nada disto aconteceu por acaso. Vejamos alguns episódios relevantes
da governação dos últimos anos.
A criação de riqueza da Madeira não tem parado de dar mostras de
perder toda a pujança dos anos 90. O PIB real da RAM passou de um crescimento
de 4% em 2004 (ano de eleições) para 0,6% em 2008. Nos Açores o crescimento
real de 2004 foi de 2,2% e em 2008 foi de 2,3% (ver quadro infra)
Madeira (crescimento do
PIB real)
|
Açores (crescimento do
PIB real)
|
|
2003
|
-3,6%
|
0,6%
|
2004
|
4,0%
|
2,2%
|
2005
|
2,0%
|
2,1%
|
2006
|
3,0%
|
3,1%
|
2007
|
1,5%
|
1,9%
|
2008
|
0,6%
|
2,3%
|
(fonte: INE)
Como se verifica pelo quadro anterior com a crise de 2003 a Madeira
apresentou um crescimento negativo do PIB real e os Açores mantiveram
crescimentos positivos. Alem disso, apesar da propaganda o crescimento real da
economia Madeira tem sido sistematicamente à dos Açores. Esta constatação não é
um regozijo mas antes um alerta para a necessidade de arrepiar caminho e
introduzir o modelo de desenvolvimento adequado que tire todas as vantagens das
potencialidades económicas que a RAM ostenta.
Nada disto é por acaso. Na verdade, a Madeira ostenta desde 2000
fragilidades na dinâmica de investimento, tendo mesmo registado as reduções
mais bruscas e mais significativas na FBCF (formação bruta de capital fixo) nos
últimos anos. Entre 2000-2005 a RAM foi a segunda região com menor formação
bruta de capital fixo (menos investimento). Pior. Em 2006 a Madeira registou a
segunda maior redução de investimento do pais (27%).
No desemprego a Região passou de uma
taxa de 3% em 2004 para, num crescimento galopante ao longo dos anos, passar a
apresentar ,no final de 2009, um resultado que não pode orgulhar ninguém e que
ascende aos 10%, são mais de 13 500 desempregados.
Apesar do suposto aumento do crescimento económico (discurso pouco
credível como se verifica pela análise do quadro em cima) a pobreza não deu
mostras de diminuir e hoje, infelizmente a Madeira é, por culpa própria, a
campeã nacional nesta matéria.
Perante tudo isto as contas públicas também não pararam de evoluir
negativamente. Só dois exemplos: despesas correntes crescem todos os anos
demonstrando uma governação despesista sem paralelo e a divida pública (hoje
superior a 5 000 milhões de euros) em descalabro desde 2 000 onde, por exemplo
só a divida indirecta aumentou mais de 1 000%. Hoje ascende (ascenderá em 2010)
a 1 500 milhões de euros.
Sobre esta situação os sinais de alerta são evidentes e têm duas
formas: a origem do endividamento é preocupante porque financia investimento
irracional e improdutivo e, por outro lado, o pagamento desse endividamento cairá
sobre os nossos filhos que sem meios libertos para pagar a divida ficarão,
ainda mais, dependentes de recursos e dádivas externas. Pode ser o rombo final
numa autonomia que supostamente deveria ser bem sucedida.
Mas este problema é agravado pela expectativa de uma diminuição do
rating da RAM, decorrente de endividamento excessivo, de opções de investimento
erradas de de necessidade de recursos externos, cujo Outlook da Moody’s, no fim
de 2009, passou para negativo.
Mais grave ainda é que durante os anos que precederam a negociação
dos fundos europeus hoje em vigor a governação de Jardim não quis ou não soube
(qual delas a razão mais grave) impedir que a Madeira perdesse 500 milhões de
euros da União Europeia e passasse a ser considerada uma região fora da coesão
e, portanto, rica aos olhos dos europeus. Esse “feito” da governação do PSD
afecta hoje seriamente as contas públicas da RAM e a capacidade de investimento
que permitisse inverter o modelo de desenvolvimento.
3. As expectativas futuras
Ora o que se espera do
futuro para a Madeira não pode ser abstracto. Tem de ser analisado à luz das
opções de política do governo que nos (des)governa. Para isso vale a pena um
olhar resumido à proposta de orçamento para 2010 do governo de Jardim e concluir
o seguinte:
1. É um orçamento
inquinado com um endividamento irresponsável, não traduz opções de
diversificação da economia, remete para a manutenção de uma política de
investimentos públicos que, em alguns casos devia ser totalmente abandonada,
noutros devia ser remetida para outras alturas de mais folga orçamental.
2. O excesso de
endividamento representa mais de 5 000 milhões, numa economia que produz por
ano, em média 4 700 milhões (incluindo o empolamento da Zona Franca) , e que
tem um orçamento financiado com mais de 45% de (mais) dívidas. Mas mais grave
que tudo isto é que se esse endividamento fosse orientado para investimento
reprodutivo. i.e. que produzisse riqueza e emprego e libertasse meios para o pagar,
o governo estava a injectar adubo na economia. Mas, infelizmente nada disso
acontece. O governo está simplesmente a apunhalar a nossa economia, onde as
dividas actuais já servem para
pagar dívidas do passado.
3. O governo não
tem visão estratégica. Ficamos sem saber o que quer o governo com a
diversificação da economia. Para isso era preciso estratégia e acções concretas
mas o governo mostra com o seu plano que:
a. Não quer mais
sectores porque na verdade não tem apostas consistentes que permita uma
verdadeira diversificação.
b. Não quer mais sectores porque mantém a
actuação da SDM num registo de planeamento fiscal e de parceria adormecida por
parte do Governo da Região.
c. Não quer mais
sectores porque não aposta decisivamente em investimento público que atraia
outros áreas de desenvolvimento.
4. Tão grave como
a ausência de diversificação da economia, porque afecta directamente a
competitividade das PME’s e o emprego, é a passividade doentia do governo na
resolução do problema dos transportes marítimos. Esta intolerável situação,
cuja resolução não tem custos, diminui a competitividade das empresas e o poder
de compra das famílias.
5. No âmbito das
empresas e do sector privado, e designadamente das PME, era esperado mais arrojo
mais coragem. Porque o investimento privado não se faz por decreto era preciso
acções concretas em áreas determinantes como:
a. propostas de
índole fiscal
b. Fundo de
recuperação de empresas
c. Apoio à reestruturação
de dívida
d. Regularização
efectiva de dívidas a fornecedores e de redução dos Prazos Médios de Pagamentos
e. reforço do
investimento em I&D
f. programa de
contenção de emprego em sectores como o turismo
6. Na área do
Investimento Directo Estrangeiro, sector essencial para a diversificação da
economia e para o aumento da riqueza da Região era fundamental:
a. a
reestruturação da gestão do CINM
b. O
estabelecimento de objectivos concretos à Zona Franca
c. O programa de apoio
ao investimento directo estrangeiro
7. Na área social
importa realçar o que o PSD e o Governo nem quer ouvir falar, nem colocou no
orçamento:
a. Além da redução
do IRS e das propostas fiscais com impacto social, como, por ex., penalizar as
concessões “oferecidas” (numa lógica de monopólio administrativo) pelo GR, para
ajudar a financiar a crise;
b. Descongelar o
tempo de serviço da administração pública e professores, como medida de total
justiça social e de impacto na propensão ao consumo;
c. Lançar um programa
especifico de luta contra a pobreza, determinante para estancar os problemas
crescentes da má de distribuição do rendimento promovido por um modelo de
crescimento económico que mantém à margem do desenvolvimento franjas
significativas de população;
d. Apoiar com
medidas efectivas os mais velhos, designadamente os reformados com pensões
abaixo do limiar de sobrevivência;
Ora, perante este cenário em que as soluções não são compatíveis com
as necessidades dos madeirenses e onde a estratégia para 2010 da governação
traduz-se numa espécie de rol de obras inconsistentes e de dividas galopantes
resta-nos esperar pelo pior.
Ou seja, a crise externa que o mundo atravessa terá na Madeira um
local fértil para se expandir e se estabelecer contando para isso com o forte
apoio do governo de Jardim. Parece óbvio que, com este panorama e esta acção política, em
2010 tudo será ainda pior e devo, obkectivamente, destacar:
a. Aumento do
desemprego
b. Aumento das
falências
c. Aumento as
bolsas de pobreza
d. Aumento da
insegurança
e. Aumento da
desconfiança junto dos empresários
f. Aumento de
forma irresponsável do endividamento para objectivos pouco prudentes
g. Afastamento
irreversível do investimento privado, com investimento público irrealista,
irracional e sem retorno
h. Consolidação do
ónus para as gerações vindouras, hipotecando a esperança dos nossos filhos
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