sexta-feira, 25 de março de 2011

Digam lá se o debate sobre o CINM não deve ser plural e profundo?


Em Maio de 2010 o Governo da República encerrou as negociações com a Comissão Europeia sobre o alargamento dos benefícios fiscais da Zona Franca da Madeira. Fê-lo (1) porque a fundamentação deficiente do processo e as reservas da Comissão não deixavam entrever um resultado positivo e (2) porque é irrealista solicitar o aprofundamento dos benefícios fiscais ao mesmo tempo que se solicita menos criação de postos de trabalho.
A pretensão da ZFM era a de dispensar as empresas nela instaladas da criação de postos de trabalho, alargando os plafonds previstos nos artigos 35º e 36º do Estatuto dos Benefícios Fiscais. Estes plafonds são já actualmente demasiado generosos, bastando a uma empresa criar 2 postos de trabalho, muitas vezes fictícios, para beneficiar de taxa reduzida de 4% até aos 2 milhões de euros de lucro tributável.
O alargamento destes plafonds é totalmente contraditório com uma política de fomento da economia real da Região Autónoma e incentiva a instalação na ZFM de empresas "caixa-de-correio" que são veículos para a fraude e planeamento fiscal.
O processo de negociações com a Comissão foi por isso definitivamente encerrado em 2010, não tendo havido qualquer desenvolvimento na matéria desde então.
As dificuldades que a ZFM tem vindo a sentir nos últimos anos resultam essencialmente de dois factores. Primeiro, de um novo contexto internacional, que agora é mais contrário aos paraísos fiscais e ao planeamento agressivo, impondo novas exigências de transparência aos territórios offshore. Depois, de uma gestão inábil da ZFM, que apostou numa angariação de empresas sem critério e numa política de confidencialidade absoluta que, alargando as receitas da concessionária no curto prazo, tornaram difícil distinguir a ZFM dos offshores puros e duros, prejudicando a defesa da ZFM no plano internacional e junto da Comissão Europeia.
Os dados divulgados publicamente pela DGCI revelam que das 2971 empresas instaladas na ZFM, 2435 não criaram qualquer posto de trabalho.
O contributo da ZFM para o PIB regional é largamente fictício, resultando de uma sobrefacturação feita pelas empresas instaladas na ZFM por razões de planeamento fiscal, como o atestam notícias recentes sobre grandes "exportadoras-fantasma".
O futuro da ZFM não pode assim passar pela manutenção da actual política de confidencialidade e pela dispensa da criação de postos de trabalho reais. Em vez disso, importa trabalhar duas áreas fundamentais:
Primeiro, é urgente começar a estudar uma fiscalidade para o todo da Região Autónoma que melhor a prepare para enfrentar um contexto internacional em que os paraísos fiscais têm cada vez menos espaço. É essencial voltar a fiscalidade regional, e a própria gestão da ZFM, para a criação de postos de trabalho e captação de investimento na economia real.
O Governo da República convidou o Governo Regional a trabalhar neste sentido, mas não obteve até agora qualquer resposta. Era urgente saber se o Governo Regional está disponível para reequacionar o modelo de governação da praça regional que incentive o investimento na economia real.
Segundo, é urgente alterar o modelo de gestão e controlo da ZFM, impondo uma política de transparência e fiscalização rigorosa, a olhar para o longo prazo, que permitam "separar o trigo do joio", incentivando a instalação de empresas reais e afastando a instalação de empresas que sejam veículos para a fraude e evasão fiscal. As empresas licenciadas na ZFM devem ser objecto de fiscalização rigorosa pela Administração Fiscal regional e a informação estatística relativa aos benefícios fiscais da ZFM deve ser tornada pública com total transparência. A promoção e defesa pública e internacional da ZFM deve passar a assentar nesta ideia de transparência e rigor que são a única forma de a distinguir de outros territórios offshore.
Neste contexto e tendo em conta as dificuldades do CINM e a desastrada política do Governo e da concessionária em termos de gestão e estratégica da praça madeirense torna-se fundamental que o Governo Regional responda de forma clara a um conjunto de questões que ainda não tiveram um cabal e consistente esclarecimento.
As perguntas concretas que o Grupo Parlamentar do PS Madeira quer ver respondida são as seguintes:

  1. É ou não verdade que o processo de negociação encerrado em 2010 assentou em informação elaborada pela sociedade concessionária da ZFM, sem qualquer revisão crítica do Governo Regional?
  2. É ou não verdade que essa atitude de demissão e falta de input crítico foi uma das principais causas para a fragilização da argumentação portuguesa e para as reservas com que a Comissão encarou todo o processo?
  3.  É ou não verdade que a pretensão de alargar os benefícios fiscais da ZFM nos termos propostos pelo Governo Regional, dispensando as empresas da criação de postos de trabalho reais, incentiva a instalação de empresas "caixa-de-correio" e de "exportadoras-fantasma", pondo em causa a sobrevivência da ZFM no longo prazo?
  4. Tem ou não tem a sociedade concessionária entregue à administração fiscal regional a lista das empresas instaladas na ZFM como manda o artigo 33º, nº17, do EBF? Em caso afirmativo, porque é essa lista mantida em segredo pelo Governo Regional?
  5. Qual é o valor dos benefícios fiscais aproveitados por cada uma das empresas instaladas na ZFM? Porque não é divulgado publicamente pelo Governo Regional?
  6. Qual é o valor da despesa fiscal incorrida com a isenção de IRC à sociedade concessionária da ZFM, válida até 2017 nos termos do art.33, nº12, do EBF? Porque é que não é divulgado publicamente o seu valor pelo Governo Regional? Ou seja, qual o valor de isenção de impostos oferecido à SDM até 2017?  
  7. Quantas acções de inspecção foram feitas às empresas licenciadas na ZFM em 2010 pela Administração Fiscal Regional?
  8.  Quantas acções de inspecção foram feitas em 2010 às empresas que não empregam nenhum trabalhador? Quais os resultados?
  9. Como se explica que não tenham sido tomadas providências para evitar a instalação na ZFM de "exportadoras-fantasma" como as que foram noticiadas pela imprensa?
  10. Qual é a parcela do PIB regional que resulta artificialmente da sobrefacturação destas "exportadoras-fantasma"? Que receita geram estas empresas para a sociedade concessionária da ZFM com a cobrança de taxas de licenciamento e que custo tem este empolamento do PIB na perda da financiamento comunitário à Região Autónoma?
  11. Qual é efectivamento o ganho de receitas fiscais com as empresas da ZFM? Como é possível avançar com perdas na ordem dos 80 ME quando em 2009 em IVA e IRC a Madeira obteve valores próximo de (apenas) 27 ME? Como se explica esta diferença?
  12. É ou não é verdade que a falta de transparência com que é gerida a ZFM levou as autoridades brasileiras a pôr a Ilha da Madeira na sua lista negra de paraísos fiscais?
  13. Que medidas de reforço de transparência e controlo foram tomadas para evitar situações semelhantes? É ou não é verdade que outros países, nomeadamente europeus, estão a ponderar incluir a ZFM nas suas listas negras como o fez o Brasil?
  14. É ou não verdade que vários países têm vindo a recusar a negociação de acordos de dupla tributação com Portugal que incluam a ZFM dada a sua falta de transparência?
  15. A sociedade concessionária da ZFM interpôs recentemente uma providência cautelar contra o Governo da República com o propósito de impedir a divulgação pública de informação estatística agregada sobre os benefícios fiscais da ZFM. Está ou não consciente o Governo Regional da grave dano que este processo publicamente traz à reputação da ZFM e à imagem de transparência que ela deve apresentar?
  16. O Governo Regional aprovou em 15 de Novembro de 2010 resolução mandatando o Secretário Regional das Finanças para alargar os benefícios fiscais da ZFM através de despacho além de 2011. Está ou não consciente o Governo Regional que esse alargamento carece de base na lei nacional e no direito comunitário? Está ou não consciente o Governo Regional que a publicação desta resolução criou um clima de incerteza total entre os operadores económicos da ZFM e que vai gerar mais um foco de conflito desnecessário entre a Região Autónoma e a Comissão Europeia?
  17. Está ou não disponível o Governo Regional para estudar e discutir medidas de reforma da fiscalidade regional que a tornem menos dependentes da ZFM e que estimulem o investimento na economia real da Região Autónoma?
  18.  Quanto pensa o Governo Regional apresentar ao Governo da República e à UE as suas propostas conforme verificado anteriormente?
  19. Está ou não disponível o Governo Regional para renegociar os termos da concessão da ZFM, obrigando o concessionário a uma política de rigor absoluto na selecção das empresas a instalar na ZFM e de transparência pública na sua gestão assim como no esforço de criação de emprego?


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