Reconheceu recentemente a necessidade de manter os benefícios fiscais existentes no CINM. Isso significa que concorda com o facto de ser prioritária a renegociação dos mesmos junto da UE, uma vez que o tempo está a escassear - e depois disso, então, trabalhar nas mudanças que defende devem ser feitas no funcionamento da Zona Franca da Madeira?
São duas questões distintas em primeiro lugar reconheço em todas as intervenções que faço a necessidade de serem retomadas negociação com a UE sobre a extensão dos benefícios fiscais mas, contrariamente ao GR, não partilho da solução apresentada à Comissão Europeia. A Madeira, através da SDM e sem contributo critico e orientador do Governo Regional pretendia em que ao mesmo tempo que se alarga os plafonds previstos nos artigos 35º e 36º do Estatuto dos Benefícios Fiscais se reduzissem as exigências de criação de emprego, conduzindo à destruição de emprego no CINM e não à sua criação. Como é do conhecimento de todos, estes plafonds são já actualmente demasiado generosos, basta comparar com a Zona Económica de Canárias, bastando a uma empresa criar 2 postos de trabalho, muitas vezes fictícios, para beneficiar de taxa reduzida de 4% até aos 2 milhões de euros de lucro tributável.
Considero por isso que o alargamento destes plafonds e a redução de exigência de criação de emprego é totalmente contraditório com uma política de fomento da economia real da Região Autónoma e incentiva a instalação no CINM de empresas "caixa-de-correio" que são veículos para a fraude e planeamento fiscal. Aiás ninguém compreenderá que uma região com mais de 17 000 desempregados não aproveite os mais de 1000 ME de benefícios fiscais que aufere todos os anos num instrumento efectivo de criação de emprego e diversificação da economia real, conforme estava previsto nos objectivos iniciais de criação do CINM.
As dificuldades que o CINM tem vindo a sentir nos últimos anos resultam essencialmente de dois factores. Primeiro, de um novo contexto internacional, que agora é mais contrário aos paraísos fiscais e ao planeamento agressivo, impondo novas exigências de transparência aos territórios offshore. Depois, de uma gestão inábil do CINM, que apostou numa angariação de empresas sem critério e numa política de confidencialidade absoluta que, alargando as receitas da concessionária no curto prazo, tornaram difícil distinguir o CINM dos offshores puros e duros, prejudicando a sua defesa no plano internacional e junto da Comissão Europeia. Aliás as noticias que circulam que dão como certo que o CINM foi colocado na lista negra dos paraísos fiscais pelas autoridades brasileiras e que alguns países europeus recusam acordos de dupla tributação com Portugal por causa da existência do CINM, devem servir de alerta para o Governo Regional sob pena de ferir de morte a credibilidade da praça e o seu futuro.
Além disso, os dados divulgados publicamente pela DGCI revelam que das 2971 empresas instaladas na ZFM, 2435 não criaram qualquer posto de trabalho.
O contributo do CINM para o PIB regional é largamente fictício, resultando de uma sobrefacturação feita pelas empresas instaladas no CINM por razões de planeamento fiscal, como o atestam notícias recentes sobre grandes "exportadoras-fantasma". Este resultado não é neutro no nosso bem estar e nas condições de financiamento da RAM. Todos sabem que a Madeira perdeu 500 ME aquando a negociação do actual quadro comunitário de apoio. E contrariamente ao que dizem os responsáveis da SDM e de alguns seus apaniguados, com o governo de cócoras numa atitude de miserável cumplicidade desviante, havia soluções que podiam ter sido apresentadas na altura junto da Comissão Europeia que permitiam manter a Madeira no grupo das regiões de coesão. A própria comissão fez um exercício de cálculo do PNBregionalizado (portanto retirando o efeito das imputações anómalas do CINM) e a Madeira ficou, nessa altura, no grupo das regiões de coesão, descendo 27 posições no ranking relativo das regiões europeias. Ora o Governo do PSD ignorou tudo isto e até meteu na gaveta o estudo do Dr. Augusto Mateus que adiantava algumas soluções que nunca foram sequer apresentadas publicamente.
O futuro do CINM não pode assim passar pela manutenção da actual política de confidencialidade e pela dispensa da criação de postos de trabalho reais. Na verdade o futuro do CINM passa sim por uma exigência maior da parte do Governo Regional em termos dos seus objectivos e dos seus resultados. A Comissão Europeia só permitirá a manutenção dos benefícios se a estratégia fôr a de criar e atrair empresas na economia real , fomentando o emprego efectivo e diversificando a economia. Só com esta atitude pro-activa é que considero possível salvar efectivamente o CINM de uma crise profunda. Mas o governo está mais de 10 anos atrasado face às necessidades do CINM. O Governo do PSD adormeceu ao sabor dos interesses da concessionária tendo sido sempre uma espécie de carteiro da SDM e não, como devia seu “patrão” dando orientações e impondo estratégias de interesse para a Madeira. Esta subserviência já valeu a perda de 500 ME. Na verdade há um exercício teórico que ninguém faz que é saber qual o custo de oportunidade dos mais de 30 000 ME de benefícios fiscais que a Madeira beneficiou até hoje. Ou seja, qual seria o resultado se a estratégia do Governo tivesse sido a atracção de empresas com critérios firmes de criação de emprego e de diversificação da economia? Basta lembrar que Portugal com apenas 300 ME de benefícios fiscais atraiu a Embraier para Portugal, uma empresa Brasileira que vai construir aviões, investir em Portugal e criar dezenas de postos de trabalho no Alentejo.
É por isso que considero que já estamos muito atrasados na redefinição do modelo de exploração do CINM (retirando o peso na orientação estratégica de um parceiro privado que tem uma concessão sem concurso, que não paga impostos e que não dá contrapartidas à RAM) e na evolução para uma estratégia mais adequada às nossas necessidades e ao contexto em que vivemos. Portanto não se trata de negociar primeiro com a UE, mas sim acautelar rapidamente um novo modelo que garanta a sobrevivência do CINM não como tem evoluído mas com inteligência económica e sentido de interesse público retirar benefícios efectivos de emprego e criação de riqueza.
Por isso, é urgente começar a estudar uma fiscalidade para o todo da Região Autónoma que melhor a prepare para enfrentar um contexto internacional em que os paraísos fiscais têm cada vez menos espaço. É essencial voltar à fiscalidade regional, e a própria gestão do CINM, para a criação de postos de trabalho e captação de investimento na economia real. Por exemplo teria sido crucial estender os beneficios fiscais na Zona Franca Industrial para os outros parques empresariais criados pelo Governo Regional, hoje completamente desertos. Esta situação é tanto mais urgente quando todos sabem que a Zona Franca Industrial é um dos pontos negros do CINM: não atraiu empresas externas apenas deslocalizou empresas da RAM provocando até uma redução nas receitas fiscais da RAM.
A verdade é que o actual Governo Central tem-se mostrado intransigente relativamente à possibilidade de encontrar uma solução para este problema. Perante o actual cenário de eleições antecipadas, acredita que um eventual futuro governo do PS, liderado de novo por José Sócrates, terá a abertura de o fazer?
As soluções para o CINM, como expliquei anteriormente dependem totalmente do Governo Regional. Repito, já estamos atrasados 10 anos, altura em que se verificou uma alteraçao nas condições de fiscalidade da praça com a proibição de instalação de entidades financeiras e o fim de instalação de empresas sem qualquer pagamento de IRC. Nessa altura o CINM passou a ser composto por Um Registo de Navios, Os Serviços Internacionais e a Zona Franca Industrial. Ou seja desde o ano 2000 que o Governo devia ter chamado a si ou pelo menos ter exigido alterações que adequassem as novas condições ao interesse da Madeira. É uma desonestidade, ou então malandrice intelectual, considerar que a situação do CINM é resultado do recente encerramento das negociações. Lembro que no inicio da década o regime em vigor esteve suspenso em 2001 e 2002 e existiram procedimentos de investigação por parte da Comissão Europeia. Portanto estes trâmites são absolutamente normais e fazem parte da vida de uma entidade como o CINM que estará sempre sujeita a vicissitudes desta natureza. Mas o que é verdadeiramente grave é ignorar que mesmo que a Comissão aceda aos interesses totais da SDM em relação ao CINM só o fará por mais 2 ou 3 anos. O que significa que em 2015 teremos outra vez o mesmo problema e a SDM e o Governo Regional acusarão na altura outro qualquer para esconder a sua tremenda e inqualificável actuação perversa face ao futuro da praça, resistindo insensatamente até acabarem definitivamente com as vantagens do CINM para a Madeira. Se é verdade que compreendo a posição do parceiro privado que defende mais lucros com menos esforço e custos, já não aceito a passividade e cumplicidade do Governo que perante os interesses privados agacha-se quase doentiamente prejudicando a Madeira. Portanto, a situação do CINM é estrutural não de conjuntura. Esta birra entre governos serve para aprofundar um debate fundamental e devia ser o ponto de partida para o Governo Regional acabar com a sua suculenta hibernação e fazer o seu papel.
Quanto ao Governo da República acho fundamental que abra o processo negocial, é a sua função e não deve criar nenhum obstáculo a esta material. Mas é importante que também seja capaz (qualquer que seja o Governo) de impedir a destruição de emprego, conforme pretende o Governo Regional.
Na semana passada, Diogo Leite de Campos (vice-presidente do PSD nacional) garantiu, em declarações ao Tribuna, que um Governo da República liderado pelo PSD resolveria o impasse vivido neste momento no Centro Internacional de Negócios da Madeira, uma vez que o único obstáculo existente neste momento - segundo disse - é o actual executivo liderado por José Sócrates. Que opinião lhe merece esta afirmação?
As questões relevantes da Zona Franca não se resolvem com este tipo de falatório politico oportunista. Aliás como referi em cima o problema central do CINM não é infelizmente a simples abertura de negociações. Este é efectivamente um problema conjuntural que estou certo já estaria ultrapassado se o Governo Regional tivesse feito bem o seu papel com responsabilidade e, sobretudo, estivesse à altura das exigencias e dos desafios do processo em curso e não comprometido de forma escandalosa com a concessionária SDM. Sublinho que o problema é estrutural e as soluções devem ser encontradas na Madeira a favor dos madeirenses e pelo Governo Regional. O Governo da República, qualquer que seja, deve estar ao nível da responsabilidade institucional.
Mas para entendermos melhor o oportunismo de Diogo Leite Campos, vale a pena questionar como pensa o fiscalista (membro dos órgãso socias da SDM) ultrapassar a agenda económica de Passos Coelho que prevê o aumento do IVA para 25%, portanto dando uma machadada sem precedente na competitividade em termos de IVA da praça madeirense. Além disso, como reage Diogo Campos perante as recentes declarações de João César das Neves, um ilustro social democrata e economist areconhecido que afirmou que os benefícios do CINM são mínimos.
Tem sido criticado por "apontar baterias" contra o CINM como consequência da sua curta passagem pela Sociedade de Desenvolvimento da Madeira. Existe uma relação causa/efeito entre ambos os factos?
Eu percebo perfeitamente o sentido e o alcance dessas insinuações vindo de quem vem. Numa sociedade em que todo o que se faz é político e toda a política assume contornos pessoais e persecutórias, é óbvio que há dificuldade em entender uma posição que vão para além da mesquinhez de uma visão tacanha e que, em termos empresariais, é da manifesta incompetência e em termos políticas de total subserviência.
Fui director da SDM a convite do Presidente actual. Na altura era Secretário Geral da ACIF e Lembro-me que que depois de uma demorada negociação considerei ser um desafio interessante para a minha carreira professional. Ao fim de 1 ano considerei que não me identificava com a gestão da SDM e saí pelo meu próprio pé. Por outro lado, acho lamentável que quando não se quer debater argumentos técnicos, económicos ou mesmo de opção política se resvale para o ataque pessoal e para a ofensa ao bom nome das pessoas. É um sinal de fraqueza e cobardia. Sinceramente, já fui muita coisa na Madeira em muitas instituições, desde o CITMA, à ACIF passando até pela instalação e presidência da Ordem de Economistas na Madeira. Além disso, fui convidado para muitos outros lugares, e todos os que me conhecem sabem que não me movem ajustes de constas nem motivações pessoais. Agora que fique claro que ninguém em nenhuma circunstância me vai calar usando esses golpes baixos e desprezíveis. Sou deputado e tenho responsabilidades perante a população da Madeira e não abdico de dizer a verdade e de constactar os factos que estudo e que investigo. Sei que é duro ouvir verdades. Sei que é pouco habitual na Madeira criticar “vacas sagradas” mas comigo será sempre assim. O compromisso que tenho é com a minha consciência e o grupo parlamentar que represento ou seja com o povo que me elegeu. Finalmente permita-me lembrar que ainda esta semana Augusto Mateus, Bagão Felix e João Cesar das Neves fizeram comentários sobre o CINM e convenhamos que opiniões destes ilustres economistas são bastante mais próximas das minhas que da SDM e do Governo Regional. Estou à espera que alguém se lembre de afirmar que estes Senhores estão a fazer ajuste de contas com a SDM ou que a sua ambição é trabalhar naquela empresa. Só fala assim quem pensa e actua assim!
Por quê não assistiu ao workshop promovido na semana passada pela SDM, no qual poderia ter levantado as questões que tem defendido ao longo dos últimos tempos em relação ao CINM?
As minhas intervenções sobre o CINM não são pessoais mas sim no quadro da minha actividade política em nome do grupo parlamentar do PS M. Por outro lado, nesta condição, entendo que o grupo parlamentar do PS não deve participar em iniciativas de forma clandestina, diminuído e em efectiva desigualdade. Na verdade se a ideia era obter posições contrárias que contribuíssem para a clarificação do tema proposto tinha sido um exercício de boa educação e sentido de responsabilidade convidar os negociadores e aqueles que foram o alvo principal do dito workshop. Mas como se viu aquilo não passou de uma encenação da SDM com a participação dos seus consultores e dos membros dos órgãos sociais (tudo gente remunerada), portanto uma acção de propaganda ao nível daquelas que faz o PSD. Da parte do grupo parlamentar do PS M teríamos tido todo o gosto em contribuir para o debate e o aprofundamento das questões relacionadas com o CINM caso a SDM tivesse tido a coragem, a frontalidade e a boa educação de convidar para o painel, ao mesmo nível e em igualdade de circunstâncias, aqueles que têm posições distintas. Mas os resultados do debate estão à vista: transformaram aquilo numa missa cantada, num Te Deum laudatório da SDM, senão mesmo do regime, simplificando a problemática do CINM aos que estão a favor de tudo em qualquer circunstância, mesmo que encerre qualquer “porcaria”. Com isto impedem a discussão de soluções sérias e responsáveis. Portanto, sempre que quiserem o meu contributo a minha disponibilidade é total desde que o debate seja sério e em igualdade de circunstâncias entre todos os intervenientes. Agora, não me peçam nem a mim nem ao PS para coonestar uma política errada do ponto de vista empresarial e marcada do ponto de vista político.